Era uma vez uma pia cheia de louça suja que insistia em habitar a minha cozinha. era uma pilha infernal. Pratos rasos em cima de pratos fundos, rodeados de frigideiras e potes de plástico que, por sua vez, abrigavam inumeráveis talheres. Acumulava tanto que parecia que ia explodir a qualquer momento. Eu evitava o monte assustador com o qual teria que inevitavelmente lidar.
A pia virou um monstro, a cozinha ficou escura e, para beber água ou cozinhar, a adentrava pé ante pé, em silêncio absoluto para não despertar a besta. Quanto mais adiava, maior a pilha ficava e maior era a sensação de que eu era incapaz de gerenciar a minha própria vida. até que uma noite, num descuido sonolento, cheguei perto. Vi um brilho metálico que não havia notado antes.
Embaixo de tudo aquilo descansava, gloriosa, uma enorme panela de pressão. Era tão robusta que elevava todas as outras louças da pia. As colocava em um pedestal amedrontador e imundo, como se forjasse um exército de baixelas revoltadas pelo abandono de semanas. A panela de pressão tinha o superpoder de fazer tudo ficar tão gorduroso, tão pesado, tão volumoso quanto ela.
A culpa era dela, então. uma vilã metálica, suja e rebelde, quem diria. munida de luvas de plástico, segurei a respiração e caminhei, determinada e com coragem, até a indômita pilha de louças. Estava pronta para o combate.
Resolvi atacar de cara a abelha rainha. Tirei todo o resto de cima com cuidado, para não acordar ninguém – nem os meus gatos nem os copos ainda limpos que dormitavam inocentes dentro do armário. Pronto! Segurei vitoriosa a panela de pressão, aquela ameaça oculta há dias. Pelo cabo dela eu carregava o peso de tantos litros de água parada que precisei usar as duas mãos. Coloquei a panela de lado e por um instante tive pena. Me lembrei que dias antes ela tinha me ajudado a cozinhar rapidamente um quilo de feijão. afastei logo o sentimento de piedade e devolvi a atenção para a pia.
Imagine você a minha surpresa quando me deparei apenas com alguns poucos pratos, meia dúzia de talheres, dois potes engordurados e uma frigideira levemente descascada. A causadora de tanto alvoroço e procrastinação havia sido a sorrateira panela de pressão. Em quinze minutos, havia lavado tudo, inclusive a minha consciência. Aliviada, abri as janelas da cozinha, devolvi os utensílios aos seus devidos lugares e me senti em paz com o silêncio da casa limpa.
FIM
(mas tem mais, fica aqui)
1) a pressão que colocamos em nós mesmos pode ser paralisadora
1) organização é tudo. o seu volume de trabalho e de tarefas domésticas pode não ser tão assustador quanto você pensa. coloque tudo no papel e se livre logo da tarefa mais pesada.
2) a pressão pode te ajudar a resolver tudo mais rápido, mas ela faz uma lambança na sua saúde física e mental que depois fica difícil consertar. além do mais, pressão demais pode te paralisar.
Joyce Campos